A afirmação da China em África e a utilização de Macau como plataforma de aproximação aos países lusófonos

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o modelo Estado resulta ideologicamente marcado, servidor de projectos concretos que não são neutros nem doutrinariamente indiferentes, satisfazendo interesses estratégicos” (Lara, 2004, 66)

Introdução

Caracterizar-se-á, numa perspectiva de enquadramento,a política externa da China e o papel crescente da diplomacia económica, factores determinantes para a sua afirmação no plano internacional. Procurar-se-á também, de forma breve, transmitir a evolução do socialismo comunista chinês como causa e efeito da estratégia de manutenção do poder e da afirmação geopolítica da China e, ainda, a comparação analógica da influência da China a um império contemporâneo, que sob a capa da cooperação internacional, se destaca pelos interesses geopolíticos óbvios e por uma atitude económica neocolonialista determinante para as suas omissões e intervenções políticas.

Após uma breve caracterização do relacionamento histórico e das relações actuais da China com os países africanos passar-se-ão a explicar as circunstâncias que surpreendentemente, dada a não existência de um património histórico-cultural comum ou proximidade geográfica, excepto no caso de Timor-Leste, possibilitam a aproximação da República Popular da China aos países de expressão lusófona.

Na última parte, será observada a importância geoestratégica da RAEM (Região Administrativa Económica Especial) como plataforma giratória entre os continentes asiático e africano e, no âmbito da cooperação estabelecida com os países de língua portuguesa, será dada especial relevância à utilização do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa por ter o sido ponto de partida para a realização deste trabalho.

Chris Alden (2007, 5) identifica três posições preponderantes em relação à afirmação da China em África. A primeira consiste na opinião, disseminada pelo governo chinês, de que a China é um parceiro para o desenvolvimento de África. Nessa perspectiva a actuação chinesa baseia-se num plano de longo prazo com expectativas de benefícios mútuos. A segunda, crê que a presença chinesa é apenas em função de um interesse imediato por recursos naturais, e terá em última instância consequências negativas para o desenvolvimento africano. A terceira é talvez a mais prevalente no Ocidente. A China teria sim um plano de longo prazo para a África, que consiste numa neocolonização. Sob o pretexto da solidariedade Su-Sul, o objectivo último na realidade é a tomada do controlo político, assumindo a China o papel histórico desempenhado pelo Ocidente.

Importa situar a questão da afirmação “neo-imperial” da China em África, a partir, do próprio conceito de ideologia. Segundo Sousa Lara (2005, 65), a ideologia preenche uma função derivativa, fundamenta e justifica acções e omissões no plano político. No contexto ideológico da aproximação da China a África é importante mencionar que este não aparenta ser um processo inocente ou filantrópico, mas antes uma forma de expansionismo geoeconómico, correspondendo nessa medida à nova formulação doutrinária e ideológica tecnocrática. As políticas externas assistencialistas da China em África parecem confirmar uma concepção mais realista da ajuda externa como ferramenta de dominação simbólica (Hattori, 2001).

A explicação básica do conceito de Imperialismo é a de um “expansionismo geopolítico e geoeconómico de um Estado, cultura ou civilização” (Lara, 1987, 472). No que concerne ao “neo-imperialismo” o domínio exercido sobre a outra nação é um domínio informal, sobretudo cultural e económico, em contraste com o domínio territorial e militar do imperialismo tradicional. Outro conceito que se afigura chave para oentendimento deste assunto é o conceito de Política Externa. Para Victor Marques dos Santos designa, geralmente, o conjunto de linhas de acção política desenvolvidas fora das fronteiras territoriais de um estado e tem como finalidade a defesa e a realização dos seus interesses, através da caracterização dos objectivos definidos num programa do governo (Santos, 2000, 89). Por outro lado, o conceito de Diplomacia Económica permite revelar um meio facilitador usado pelos estados para impor e integrar a sua política externa nos países de recepção.

Interessa, por fim, definir as designações utilizadas para descrever o conjunto de países que abarcam este estudo. Quando falamos nos países que partilham a língua portuguesa: Portugal, Brasil, Cabo-Verde, Moçambique, Guiné-Bissau, Angola, Timor-Leste, São Tomé e Príncipe, comumente os referimos, no seu conjunto, como o espaço lusófono. As interrelações que dentro desse espaço se desenvolvem dividem-se, por um lado, em Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), do qual consta Macau, e por outro em PALOPS (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa), cuja ligação se evidencia pela cooperação bilateral.

Política Externa: A acção crescente da Diplomacia Económica

Para examinarmos o processo de afirmação «neo-imperial» da China na cena internacional não podemos isolá-lo do que tem sido, desde a fundação da República Popular, o contexto histórico da sua política externa.

Importa, no entanto, reportar ao período colonial a que este país entende ter sido sujeito pelas potências europeias e que resultou no enfraquecimento da sua influência no plano internacional, para melhor compreendermos a sua orientação.

Durante 2000 anos o império chinês nunca enfrentou outra potência que pudesse conquistar a sua proeminência (Mendes, 1997b, 94). Estrangeiros eram concebidos como bárbaros, e relações tributárias eram mantidas com o império do meio. Entretanto, este quadro foi invertido duranto o século XIX quando o colonialismo ocidental vitimizou e humilhou a China (Moreira, 2000, 306). Em seguida o Japão também participou da humilhação chinesa, empreendeu a Guerra Sino-Japonesa, em 1894. ARússia, Grã-Bretanha, Estados Unidos e a França forçaram, em 1900, o governo Qing a assinar tratados dividindo a China em esferas de influências.

De facto, a viragem na política externa da República Popular da China, bem como, o seu papel no contexto das Relações Internacionais, somente se veio a alterar com a Segunda Guerra Mundial. Não obstante, foi sobretudo com a conquista de poder por Mao-Tsé-Tung e com a liderança do grupo dos não-alinhados, altura em que se assume como alternativa aos EUA e a URSS e usa o seu legado de agressão colonial e experiência de libertação como forma de desenvolver laços com países recém descolonizados, que a China começou a “definir o seu rumo”, passando a reger as suas relações com base na doutrina dos Cinco Princípios da Coexistência Pacífica: respeito pela soberania, não-agressão, não-ingerência, igualdade e benefícios mútuos. É pois com base na proclamação dos “Cinco Princípios da Coexistência Pacífica” e no quadro da sua relação com as nações em desenvolvimento, em especial com África e América Latina, que deverá ser entendida a abordagem da China face aos Países de Língua Portuguesa (PLP), uma vez que, à excepção de Portugal, todos os restantes PLP se situam na orla do que dantes era designado por “Terceiro Mundo”. Desenvolvida a partir de 1953-1954, a política chinesa da “coexistência pacífica” fomentou movimentos de independência e consolidou influências e ascendentes nos vácuos de poder deixados pelas potências colonizadoras (Mendes, 1997b, 183-4).

É curioso verificar que, para consolidar essa influência e ascendentes, apesar de não dispor de recursos ao mesmo nível das superpotências e da proclamação da sua política de “coexistência pacífica”, delineou uma estratégia de penetração traduzida em assistência técnico-militar, especialmente em apoio aos movimentos de libertação e aos governos de países recém-independentes de inspiração marxista-leninista, procurando impedir o reconhecimento de Taiwan como país independente e, ao mesmo tempo, garantir o apoio dos países dos 3 As (África, América e Ásia) no quadro da ONU. A esse respeito afirmou o Prof. Doutor Políbio Valente de Almeida, em 1965, que a influência chinesa nos movimentos subversivos teria sido confirmada por vários testemunhos. Referiu, para o efeito, o exemplo de uma publicação editada e distribuída por Pequim na qual constariam várias declarações de apoio aos movimentos de libertação, “Tomem as armas, aniquilem os colonialistas – a luta pela libertação nacional na Guiné Portuguesa” (Almeida, 1965, 291). O contexto desse apoiorevolucionário era a África recortada, de um ponto de vista geopolítico, pela arbitrariedade das metrópoles europeias. Gerências e e potentados mudavam de um dia para o outro em decorrência dos conflitos de natureza nacionalista e mercantilista a que se sujeitavam os impérios coloniais (Lara, 2005, 483). A esses conflitos subjaz uma ideologia, compartilhada por ambos os pólos capitalista e marxista-leninsta, de manutenção das fronteiras impostas pelas metrópoles e criação de Estados com elites fracas e relações económicas dependentes.

Ainda sobre a análise da importância da política externa da RPC (República Popular da China) para a sua afirmação no plano internacional, devemos considerar Deng Xiaoping, grande reformador da China Comunista e a quem se deve a proposta de liberalização da economia e a doutrina de uma economia socialista de mercado. Com Deng Xiaoping a China proclamou, no início dos anos 80, uma postura de política externa independente, substituindo o radicalismo de Mao-Tsé-Tung por uma abordagem pragmática, consensual, sofisticada e diplomática, em antítese ao estilo revolucionário do seu antecessor. O desenvolvimento e modernização da economia, ainda hoje âmago da sua política, serviram na altura para conduzir à satisfação das necessidades internas de um país que viu o seu território, durante os três primeiros quartéis do século XX, ser ocupado por esferas de influência e ser vítima de ataques imperialistas.

Deste processo de liberalização, justificado pela lógica marxista-leninista da necessidade de uma fase capitalista para atingir o último patamar do socialismo, surgiram efeitos óbvios, como o crescimento exponencial da economia chinesa, a ocidentalização dos costumes, o surgimento de uma nova classe empresarial ou a apetência pelos bens de consumo, etc.

Hoje a China, a par da forte penetração ideológica que caracterizou o período da Guerra Fria, tem-se concentrado para satisfazer as suas necessidades económicas, em optimizar as suas relações comerciais com a América Latina e África, pólos com vasto potencial de crescimento, concorrendo activamente com os EUA e UE, seus parceiros tradicionais. A extensão e a diversidade de recursos, a história e a localização geográfica, identificam nestes países, sobretudo no conjunto dos países de língua oficial portuguesa, mercados ideais para a formação e desenvolvimento de redes estratégicas.Aí a China encontra o que precisa para a sua modernização interna e ascensão internacional.

A China tem, gradualmente, vindo a preparar-se para emergir como potência mundial. Neste sentido, vai adoptando regras e normas internacionais, desenvolvendo acordos de cooperação bilateral, aderindo a acordos multilaterais de segurança de comércio, desburocratizando os mecanismos de política externa e preparando os seus diplomatas. Adicionalmente, nos últimos anos, os líderes políticos chineses têm feito frequentes visitas de Estado. Não se pode omitir que a China procura seguir uma política de “boa vizinhança”, nomeadamente com os países que concorrem activamente no processo de afirmação no ambiente externo. Podem destacar-se, no entanto, dois vectores nesta postura. Por um lado, uma “diplomacia de charme” (Kurlantzick, 2007) destinada a diminuir desconfianças nesses países e a apresentar a China como “potência pacífica” ou, parafraseando o Primeiro Ministro chinês Wen Jiabao, um “elefante amigável” e o crescente envolvimento com organismos regionais multilaterais. As percepções chinesas sobre tais organizações evoluíram da suspeição e passividade para o apoio e envolvimento pró-activo. De acordo com Johnston (2003), a China apresenta níveis de participação em instituições internacionais e graus de conformidade com normas internacionais que a caracterizam como uma potência status quo. Através da socialização de diplomatas e decisores chineses em instituições internacionais, a mentalidade pautada desde a dinastia Ming pelo “realpolitik” aos poucos cede e se aproxima das crenças e da ideologia predominante da comunidade internacional, tal como a valorização do multilateralismo (Johnston, 2008).

Hoje, a China participa activamente nas organizações e mecanismos de diálogo multilaterais regionais procurando, tanto nos fóruns intergovernamentais de diplomacia “Track I”, como nos fóruns não-governamentais “Track II”, ambos considerados fundamentais por Pequim para expandir a sua influência política, estratégica e económica, ser, ao mesmo tempo, louvada pela comunidade asiática e internacional e tirar partido do seu crescimento económico, através da sua “emergência pacífica”, que contrapondo a hegemonia militar norte-americana, tem-se afirmado pelo conceito global da diplomacia económica apaziguando a comunidade internacional.

Tabela 1. Participação da China em mecanismos de diálogo multilaterais regionais

Fóruns intergovernamentais (Track I)

Fóruns não-governamentais (Track II)

ASEAN+1 (ASEAN e China)

Conselho de Cooperação sobre Segurança

ASEAN + 3 (ASEAN e China, Japão e

da Ásia-Pacífico

Coreia do Sul)

 

ASEAN Regional Forum (ARF)

Shangri-la Dialogue

ASEAN Vision Group

 

Organização de Cooperação de Xangai

Northeast Asia Security Cooperation

(SCO)

Dialogue

Conselho Económico da Bacia do Pacífico

 

«conversações a seis» sobre o armamento

Forum Boao

nuclear norte-coreano;

 

Da Vitimização ao Asiatismo

É possível identificar uma mudança de atitude da RPC ao longo dos tempos. De facto, as acções políticas da China evidenciam que substituiu a mentalidade de vítima pela de grande potência, apesar da recusa em integrar um G2 com os Estados Unidos e apesar de manter no seu discurso a identidade de país em desenvolvimento. A técnica da “vitimização” perante a ameaça externa foi uma constante na actuação da China ao longo dos tempos. A China reivindica o reconhecimento como país de terceiro-mundo não só por conta do seu subdesenvolvimento, mas principalmente por ter sido vitimada pelo expansionismo ocidental (Lara, 2002, 229). A humilhação sofrida ao longo de um século fundamenta ideologicamente a “re-emergência pacífica” contemporânea no discurso oficial (Callahan, 2004, 202). A China tem como objectivo prioritário “construir uma sociedade próspera sob todas as formas” e está apostada, no contexto do seu reposicionamento como actor político-económico do sistema internacional, em “recuperar a sua condição geopolítica natural como «império do meio»”.

A dúvida subsiste sobre o tipo de opções que os líderes chineses irão tomar à medida que o poder e a influência aumentarem. É importante não esquecer que a acção política da China continua a ser executada sob um regime autoritário de partido único. A China é, simultaneamente, “gato branco” e “gato preto”, como o próprio Deng Xiaoping um dia a caracterizou. Esta fórmula sintetiza a ambiguidade da sua emergência, das suas ambições e opções geopolíticas geradas por um regime monista-totalitário que teve quese adaptar e introduzir mudanças para que a sua ideologia de estado não fosse considerada desactualizada, insuficiente e inoportuna. Foi, por isso, forçada a conviver, a concordar e a dialogar de forma a ultrapassar a incompatibilidade ideológica. Disso é exemplo o surgimento, com o crescimento exponencial da economia chinesa, de uma classe empresarial que imita os congéneres de países capitalistas (Lara, 2002, 232).

Entretanto, a flexibilização ideológica produz contradições inerentes ao sistema capitalista tais como a apetência pelos bens de consumo, a ocidentalização e americanização dos consumos (começando pela informática e acabando na comida rápida), o agravamento da marginalidade, das máfias, dos tráficos mais diversos, das modas ocidentais, desde a música aos filmes, do vestuário aos adereços. Tudo isto, afirma, é contra o socialismo real e moral laica e ateia do marxismo-leninimo. E é, por esse motivo, que o Partido Comunista Chinês, desde meados da década de 90, inclui no seu discurso o apelo a uma nova ética, a um novo patriotismo, e até às virtudes familiares, que muitos têm apontado como uma ponte para o renascimento de um novo tipo de nacionalismo imperialista. Após esse momento tem-se feito um cada vez maior apelo à história e à tradição da China como travão possível para a invasão dos “valores ocidentais” (Lara, 2002, 233) e acentuou-se a ideia de que as estruturas sociais asiáticas, baseadas nos princípios de valor reunidos por Confúcio teriam algo de “inerentemente superior” relativamente aos padrões ocidentais.

De facto as altas lideranças políticas em Beijing crescentemente fazem alusão ao confucionismo, por exemplo na política distintiva da administração de Hu Jintao, a “sociedade harmoniosa”. Recentemente têm inclusivé ampliado esse conceito para o plano internacional. Circula, tanto em meios académicos quanto nos meios de comunicação, uma nova visão chinesa da ordem mundial denominada “mundo harmonioso”. É uma extensão do conceito homólogo doméstico, e tem bastante ressonância com a noção de “tianxia”, ou “tudo sob o céu”, proposto por Zhao Tingyang (Callahan, 2007). Tianxia é uma visão profundamente chinesa de uma ordem mundial que procura conciliar o nacionalismo com o cosmopolitanismo, teoricamente forças antagónicas. Entretanto, preocupa analistas mais cépticos, pois pode também ser interpretado como uma componente de uma estratégia global neo-imperial, que procura reduzir a diversidade global numa visão sinocêntrica.Por outro lado, é interessanteverificar que no processo de retorno da China à sua dimensão antiga de grande potência, de império do meio, a ideologia maoísta serviu, também, de ideologia de justificação.

A sociedade chinesa é actualmente uma sociedade cada vez mais tecnológica que vive do pragmatismo da técnica e da eficácia. As doutrinas do comunismo e do capitalismo comungam, respectivamente na teoria e na prática. Existe a necessidade de estabilizar a sociedade para uma sustentação do sistema. É a ideologia dita da tecnocracia. A República Popular da China adopta explicitamente como ideologia de Estado o socialismo comunista, mas é curioso verificar que algumas soluções da sua política não consagram essa opção ideológica, como é o caso do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa e, nesse âmbito, a utilização geoestratégica da Região Administrativa e Especial de Macau, cujo carácter é implicitamente economicista.

Para concluir, é importante transmitir a ideia de que uma nova leitura da ideologia socialista do século XXI aponta para um “pragmatismo tecnocrático”, manifestamente expresso na actual presidência da RPC que, pertencente à elite política chinesa designada de quarta geração, representa a ideia de um fosso entre um Partido Comunista Chinês “antiquado” ancorado no marxismo-leninismo-maoismo e uma ideologia instrumental (Romana, 2005, 162) cujos resultados têm sido, por exemplo, o incremento do Investimento Directo Externo nos PALOP, reflectindo explicitamente a evolução da postura chinesa e a necessidade de adaptação e ajustamento da sua ideologia à realidade actual.

China: um novo Império

“The international system of the twenty-first century will be marked by a seeming contradiction: on the one hand, fragmentation; on the other, growing globalization. On the level of the relations among states, the new order will be more like the European state system of the eighteenth and nineteenth centuries than the rigid patterns of the Cold War. It will contain at least six major powers – The United States, Europe, China, Japan, Russia and probably India” Henry Kissinger (1995, 825) 

A China é o principal responsável pela nova centralidade da Ásia no contexto das Relações Internacionais. A propósito desta zona do globo, Henry Kissinger escreveu que a nova ordem será semelhante à da europeia dos séculos XVIII e XIX, ambos marcadamente imperiais. No plano das relações entre os estados, a nova ordem é mais parecida com o sistema estatal europeu dos séculos XVIII e XIX do que com os padrões rígidos da Guerra Fria e contém pelo menos seis grandes potências: Estados Unidos da América, União Europeia, China, Japão, Rússia e Índia (Kissinger, 1995, 825 a 832). A China é considerado o país mais populoso do mundo, com 1/5 da população mundial, quatro vezes mais população que os EUA e três vezes mais que a da UE. A nível geográfico, o seu território inclui uma enorme diversidade e para além de todos os seus recursos naturais ainda possui uma civilização milenar e uma história de mais de 4000 anos.

A este propósito José Adelino Maltez também ressalta o facto de que na China e na Rússia a estrutura marxista do poder teve a função de desencadear o desenvolvimentalismo industrial e um Estado Socialista foi obrigado a assumir o papel opressor do Estado Capitalista, que aquele visava ideologicamente extinguir (Maltez, 1993, 37).

Numa outra perspectiva, o Professor Sousa Lara é peremptório em afirmar, que este país se encontra numa terceira fase de imperialismo, expresso pelo seu expansionismo desde 1949. A China passou, como o mesmo também afirma, de império decadente, sujeito aos imperialismos, a República Socialista, também ela imperialista (Lara, 2002, 14). E se a explicação básica deste conceito, apresentada pelo mesmo, é, como já identificámos, a de um “expansionismo geopolítico e geoeconómico de um Estado, cultura ou civilização” (Lara, 1987, 472), a vulgata de Hobson, retomada por Lenin, de que o imperialismo é ponto máximo do desenvolvimento do capitalismo, continua a projectar a sua sombra sobre a interpretação deste conceito. De facto, é evidente que a componente económica numa época de capital financeiro mais sofisticada como é a nossa, é mais relevante do que na Antiguidade, e por isso parece ter cada vez maior relevância. O sistema tem, pois evoluido dando razão à lógica marxista de que é atravésdas relações de propriedade e das relações de produção que se irá controlar a superestrutura política, e o próprio poder, essência dos últimos imperialismos.

Se, por outro lado, reduzíssemos a teoria de Bismark de que “os impérios são mercados” e a pudéssemos adaptar à realidade da República Popular da China, seríamos obrigados a associar a essa ideia o conceito de neocolonialismo. Ao considerarmos esta lógica mercantilista estaríamos a afirmar que a atitude da China sobre os países do chamado terceiro mundo, mais do que filantrópica, teria como objectivo o usufruto das matérias-primas e o escoamento dos produtos acabados para esses países. E nesse sentido esta lógica é indiscutivelmente imperial: os grandes Estados, senhores de importantes poderes, internos e sobretudo internacionais, tendem a afirmar-se sobre os mais fracos e a exercerem o predomínio político, económico, militar e social (Lara, 2004, 49), enquanto que, para Adriano Moreira, “houveram sempre potências que ocuparam o topo da hierarquia, e o que a China está a fazer é derrubar a Muralha e a mostrar a bandeira, como já fez no Pacífico”. (Moreira, 2000, 446).

Também Nuno Canas Mendes tem abordado esta temática em algumas das suas obras (ver 1997a e 1997b). Por exemplo, aborda o paradigma do imperialismo e da dependência. Refere que alguns teóricos defendem que mesmo após a descolonização, a lógica imperialista continuou a prevalecer na leitura das relações internacionais, agravando a situação de subdesenvolvimento do Terceiro Mundo. Países em desenvolvimento percebem a actuação de empresas e organizações multinacionais como formas de prolongar a espoliação histórica, e reivindicam uma nova ordem económica internacional, sem dependências e sem periferias. Nesse sentido também podemos adaptar o resultado da sua análise à realidade actual. A estrutura do comércio entre a China e a África sustenta relações de dependência similares aos identificadas por Cardoso e Faletto (1970) entre a América Latina e o Ocidente, isto é, importação de produtos primários africanos e exportação de produtos com alto valor agregado manufacturados na China. Noutra perspectiva, nomeadamente na teoria do sistema-mundo (Wallerstein, 1974), a China torna-se o centro, e a África continua como periferia.Com efeito, a China, nos dias de hoje, tanto pode ser vista como um perigo ou como uma esperança. Um perigo se abandonar as suas tradições, o seu extraordinário valor cultural, e a sua estupenda vitalidade, substituindo-as por algo que, em troca de melhores condições de vida material, lhe exigirá renúncia de si mesma e uma esperança se, atingido o desenvolvimento económico desejável, mostrar que não renegou o passado (Almeida, 1965, 13). A confirmação dessa percepção, nos dias de hoje, depende novamente da ideologia que se pretenda defender. Tal como é ideologia considerar ou não que a RPC exerce imperialismo sobre as ex-colónias portuguesas de África. Mas facto é que as características se identificam com os conceitos.

Retrospectiva evolutiva das relações sino-africanas

Em traços gerais documentam-se contactos da China com países africanos no século X a.C., altura em que se terão iniciado as primeiras trocas comerciais. A partir do século X d.C. iniciaram-se os primeiros movimentos migratórios chineses, provenientes das províncias de Fujian, Guangdong e Hainan rumo à costa africana, sendo ainda de destacar o breve período de expansão marítima, no século XV, com a célebre viagem diplomática de Zheng He. No entanto, só na época contemporânea, sobretudo desde a fundação da República Popular da China, em 1949, dado este país não ter até então uma posição expansionista como a que tinham, por exemplo, os Estados Unidos da América éque o interesse neste continente passou a ser um interesse mais constante. Durante o período da Guerra Fria era um interesse marcadamente político que prosseguia uma estratégia de expansão do socialismo internacional; na década de 70, tendo a grande maioria dos países africanos alcançado já a independência, o discurso chinês sofreu uma ligeira transformação, sublinhando a partir de então, e cada vez mais, a questão do subdesenvolvimento como o elo de ligação entre ambos; nos anos 80, à medida que a Guerra Fria se ia dissipando e a China aprofundando as reformas económicas o interesse de Pequim foi adquirindo um carácter mais económico, tornando-se aliás ainda mais evidente na década de 90. Em Maio de 1996, no decurso de uma visita oficial a seis países africanos, Jiang Zemin propôs o desenvolvimento de um relacionamento de cooperação mais estreito e estruturado a longo prazo entre a China e os países africanos levando ao nascimento, em 2000, do Fórum de Cooperação China-África.A realidade actual das relações sino-africanas

No tocante à frente política, a actuação do governo chinês ainda se enquadra actualmente, tal como no período da Guerra Fria, no objectivo de neutralizar a “diplomacia da ajuda” levada a cabo por Taiwan, que tem em África a sua principal base de reconhecimento internacional (Romana, 2005, 243). Neste âmbito é de especial interesse verificar que a China não mantém, por exemplo, relações diplomáticas na África com S. Tomé e Príncipe dada à ligação política deste país com Taiwan, nem com Burkina Faso, Gâmbia, e Suazilândia.

No plano económico, a energia, os recursos naturais, o “soft power” e liderança são os principais interesses estratégicos. Decorrendo da sua necessidade de afirmação e a sua crescente necessidade em obter energia além fronteiras, a RPC pretende a multipolaridade quer pelo estabelecimento de relações que permitam fortalecer o poderio económico e militar, quer pelo acesso facilitado a matérias-primas, mercados e recursos energéticos.

O investimento nestes países, quer na energia, na construção de infraestruturas, saúde ou educação descreve a tentativa de “comprar” os seus líderes. Acrescentam-se o estabelecimento de acordos atractivos fazendo com que a China vá ganhando aliados, ao mesmo tempo que, expande de forma eficaz o seu “soft power”. Estes acordos incluem o perdão de dívidas, cooperação tecnológica, e acima de tudo o incremento de relações comerciais.

Em África esta nova política é bem aceite. A China é responsável por uma importante parcela do apoio ao desenvolvimento, o que se traduz, naturalmente, num acréscimo da margem de manobra e no poder de negociação sobre estes países. Daí Pequim ter realizado, no ano de 2000, a primeira cimeira China-África e ter emitido, em 2006, um documento que regula a sua política sobre este continente, ambos reflectindo como um dos pontos a favor da China para a sua aceitação no continente africano o facto de não ter passado colonial demonstrando a crescente importância do relacionamento com África e o forte empenho do governo central chinês.Não obstante as estatísticas de ajuda externa chinesa serem confidenciais, Brautigam (2009) estima que a ajuda oficial para o desenvolvimento provenientes dos cofres em Beijing tenha alcançado US$2.5 mil milhões em 2009. No verão de 2009 um oficial chinês chamado Xu Shanda propôs publicamente a fundação de um “Plano Marshall” chinês para a África com um lastro de US$500 mil milhões. Embora a soma seja exagerada, a ideia gerou interesse por parte de formuladores de políticas e não é tão absurda tendo em vista a política de empréstimos de Beijing. De acordo com uma pesquisa da Financial Times (Dyer et al. 2011), por meio de empréstimos que totalizaram US$110 mil milhões em 2009 e 2010, a China ultrapassou o Banco Mundial em empréstimos a países em desenvolvimento. Muitos empréstimos são feitos em Renminbi, para que o crédito seja gasto em produtos chineses.

A instrumentalização da língua portuguesa como vector de projecção estratégica das relações da China com os países lusófonos

Apesar das relações da China com os países africanos se terem iniciado no século X a.C, nada fazia supor, antes da transição de Macau, que a China pudesse desenvolver relações estreitas com o Brasil, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde ou sequer com Timor-Leste, dada a não existência de um património cultural comum ou proximidade geográfica excepto no caso de Timor-Leste.

A China tem usado a herança cultural de Macau como “ex-colónia” da República Portuguesa de forma a fortalecer a ligação com estes países. Neste contexto a língua portuguesa é o principal elo que este país tem utilizado para se aproximar e fazer valer os seus interesses quer no campo político, quer no campo económico. Com mais de duzentos milhões de falantes nativos é a sexta língua materna mais falada no mundo

O cenário traçado para as relações da RPC com os países africanos repete-se nos PLP. “O comércio bilateral tem vindo a crescer a um ritmo acelerado em anos recentes, sendo que dos quatro PALOPS’s Angola é de longe o maior parceiro comercial da China.

Alguns desses interesses estratégicos desta ligação são óbvios. Com Angola, por exemplo, o maior interesse é a exploração do petróleo, uma vez que a China dependecada vez mais da importação de energia e esta representa uma alternativa cada vez mais viável ao Médio Oriente. Em troca a China disponibiliza ajudas económicas aos países em desenvolvimento.

Presentemente, a China é o maior parceiro comercial do Brasil. Apesar de uma queda nos negócios em 2009 decorrente da crise mundial, o comércio bilateral alcançou US$56.3 mil milhões em 2010 comparado a menos de US$ 37 mil milhões em 2009. Exportações para a China chegaram a quase US$31 mil milhões, comparados a US$21 mil milhões em 2009..

O Comércio entre a China e a Angola atingiu US$25 mil milhões em 2010, um número astronómico considerando que o PIB do país está em torno de US$85.8 mil milhões. Entretanto, exportações angolanas praticamente resumem-se ao petróleo. Por isso a China reduziu tarifas para incentivar a diversificação de produtos. Há meses em que Angola supera a Arábia Saudita como principal fonte de importações de petróleo da China. De acordo com o Energy Information Administration do governo norte-americano, em 2009 a China consumiu 8.3 milhões de barris de petróleo por dia. Esse número deve duplicar até 2035 garantindo a crescente demanda pelo petróleo angolano.

Por sua vez, Moçambique representa para a China, a porta de entrada para a África-Austral. Apesar das relações económicas serem fracas se comparadas com Angola, o volume de comércio de 2007 para 2008 aumentou 48%, atingindo o valor de US$442.7 milhões (Jansson & Kiala, 2009, 4). Centenas de milhões de dólares foram doados pela China para a construção, entre outros, do parlamento Moçambicano e de um centro de conferências, habitações populares, etc.

Em relação à Guiné-Bissau, as relações diplomáticas foram restabelecidas em 1998, e em 2002, o volume comercial foi de 4.504 milhões de US$ (exclusivamente provenientes da China). Em 2009 esse quadro não mudou, mercadorias chinesas ainda representavam apenas 2.4% das importações do país, menos de US$6 milhões. De acordo com estatísticas da OMC, a Índia absorve 86.6% das exportações da Guiné-Bissau. Entretanto, as empresas chinesas têm negociado projectos na construção de bairros.

Respeitante a Cabo Verde, o fluxo comercial em 2002 atingiu 1.839 milhões de US$ (unicamente a partir da China), mantendo-se pouco relevante actualmente. Embora seja um mercado limitado, Beijing tem vindo a intensificar não só as exportações (indústria ligeira), como também o número de contratos para financiar o desenvolvimento do país.

Quanto às relações comerciais entre a República Democrática de Timor-Leste e a China estas encontram-se ainda numa fase inicial. Contudo, é de assinalar que a China para além de ter doado cerca de 8,6 milhões de Euros para a recuperação das infra-estruturas, tem no território uma empresa na área da prospecção de gás e de petróleo. Acresce ainda o facto de a China ter enviado 16 milhões de Euros não só para a construção do edifício do Ministério dos Negócios Estrangeiros, como também para apoiar o desenvolvimento da agricultura e da saúde. Ademais, o governo em Díli recentemente comprou navios chineses para patrulhamento e recebe formação para guardas costeiros.

Dos PLP apenas São Tomé e Príncipe devido às relações diplomáticas que mantém com Taiwan não mantém trocas comerciais significativas, superiores a US$1 milhão, com a China.A Utilização da RAEM como plataforma de aproximação aos Países Lusófonos: Macau após 1999 e sua importância geoestratégica

Macau é referência para uma China moderna, mesmo que a credibilidade atribuída à fórmula “um país, dois sistemas”, não seja partilhada. A importância deste pequeno território reside no âmbito das relações internacionais. Não só no contexto dos países do Sudeste Asiático, mas no contexto do relacionamento com países distantes com ligação histórica, cultural ou comercial à RAEM, tendo sempre como objectivo edificar plataformas de cooperação e utilizar o território como base de triangulação e intermediação de relacionamentos económicos e comerciais.

Foi sob o enquadramento das mais-valias da condição de legado histórico das relações sino-portuguesas que a China procurou potencializar Macau como plataforma de ligação aos países de língua oficial portuguesa. Considerando o peculiar contexto histórico e cultural de Macau, o Governo Central da China tem vindo a dar um apoio entusiástico no sentido de que Macau se torne numa plataforma de cooperação económica e cultural entre o Continente Chinês e os países de língua oficial portuguesa.

A funcionalidade de Macau apesar de delimitada pelas suas características e condição de micro-território é definida a partir da sua capacidade em se integrar, devido à dualidade do sistema político e económico em que está inserido, a nível global. (Romana, 2005, 284 e 285). Neste âmbito, esta especificidade de Macau, potenciada pela sua inserção na “Grande China” e também pelos laços com o mundo lusófono tem sido maximizada nos seus aspectos geoeconómicos. A sua condição de legado histórico das relações sino-portuguesas é geradora de mais-valias que deverão ser percepcionadas à luz, por um lado, do aprofundamento das relações diplomáticas entre Pequim e Lisboa, e por outro lado, da sua condição de ponto de intersecção de culturas. É sob este enquadramento que Macau se potencia como plataforma de ligação entre a China e os países de língua oficial portuguesa. A instalação em Macau da sede do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa é expressão efectiva da aposta da China em reforçar a internacionalização deste pequeno território, tendo em antecena, os contactos privilegiados ao longo dos tempos entre Macau e o mundo lusófono.As vantagens de Macau, como uma ponte intermediária de economia e comércio entre a China Continental e os países de língua portuguesa, evidenciam-se pelo facto da Região Administrativa Especial de Macau ter adoptado um enquadramento jurídico e administrativo semelhante ao do Continente Europeu, de modo a facilitar uma aproximação dos mercados de Língua Portuguesa ao mercado da China Continental, contribuindo também para essas vantagens o facto da portuguesa se manter, a par da língua chinesa, língua oficial de Macau.

Através das características acima referidas verificamos as condições de que Macau beneficia no âmbito da cooperação internacional e especialmente na promoção dos laços económicos e comerciais entre a China Continental e os países de língua portuguesa. Não suscitam dúvidas que Macau é, o pólo dinamizador das actividades do Fórum. Afigura-se no entanto difícil aferir o valor acrescentado do Fórum de Macau em termos de reforço das relações económicas da China com os PLP, sabendo-se que a China tem privilegiado a via bilateral para reforço da sua presença nos países onde detém maiores interesses económicos (Brasil e Angola).

O Caso do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (Macau)

A iniciativa de organizar um Fórum desta natureza, alicerçado no tema da cooperação económica e desenvolvimento partiu, em 2003, do Governo Central da RPC. Os objectivos oficialmente traçados pelo mesmo prenderam-se, em primeiro lugar, com o reforço da cooperação e do intercâmbio económico entre a República Popular da China e os países de língua oficial portuguesa, em segundo lugar, com a dinamização do papel de Macau como plataforma de ligação a esses países e entidade executante deste evento e, por último, com a promoção do desenvolvimento conjunto da República Popular da China e dos países de língua portuguesa.

As conferências ministeriais têm realização de três em três anos, tendo a 1ª Conferência Ministerial tido lugar em Outubro de 2003 e, as 2ª e 3ª respectivamente, em Setembro de 2006 e Novembro de 2010. integrando como países membros a República Popular da China e sete países de língua oficial portuguesa nomeadamente, Portugal, Brasil,Moçambique, Cabo Verde, Angola, Guiné-Bissau e Timor-Leste. Destina-se a estabelecer um enquadramento para a cooperação económica entre estes países e a contribuir para a promoção do desenvolvimento mútuo. No decorrer do mesmo foi definido e assinado pelo Vice-Ministro do Comércio da China, An Min, e pelos ministros dos países participantes um Plano de Acção para a Cooperação Económica e Comercial, cobrindo diversas áreas tais como cooperações inter-governamentais, empresariais e comerciais visando o reforço do intercâmbio e promoção do investimento e pretendendo ser o documento orientador deste Fórum.

O Plano de Acção veio também anunciar a institucionalização do Fórum na Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), e o estabelecimento de um Mecanismo de Acompanhamento constituído por um Secretariado Permanente, em Macau, e por uma rede de Pontos Focais designados por cada um dos países.

O Mecanismo de Acompanhamento composto pelo Secretariado Permanente em Macau, garante o apoio logístico e financeiro, bem como, a ligação indispensável para a concretização das iniciativas e dos projectos. Enquanto que a rede de Pontos Focais, criada pelos países participantes, assegura o acompanhamento e a avaliação da execução das iniciativas acordadas no Fórum.

O Secretariado Permanente é, por seu lado, constituído por um Secretário-Geral, quatro Secretários Gerais Adjuntos (China, Macau e dois dos Países de Língua Portuguesa) e dois representantes de cada país. Os mandatos são exercidos por um período de três anos, sendo os representantes dos Países de Língua Portuguesa designados rotativamente e por ordem alfabética. O Secretariado Permanente é composto por um Secretário-Geral, quatro Secretários-Gerais-Adjuntos e dois membros por País Participante. O Secretário-Geral tem por funções a coordenação dos trabalhos do Secretariado Permanente. No exercício das suas funções, o Secretário-Geral é coadjuvado pelos Secretários-Gerais Adjuntos.

As reuniões ordinárias do Secretariado Permanente têm uma periodicidade anual e são dirigidas e convocadas pelo Secretário-Geral, após consulta aos Países Participantes no Fórum. A data, local e ordem de trabalhos das reuniões são acordadas mediante consultas aos Países Participantes no Fórum, através dos respectivos Pontos Focais. Sobproposta de qualquer um dos Países Participantes no Fórum ou por iniciativa do Secretário-Geral e após consulta aos Países Participantes, o Secretariado Permanente poderá reunir em sessão extraordinária.

As decisões do Secretariado Permanente são tomadas por consenso. Na ausência de consenso, as decisões são tomadas por maioria simples.

O cargo de Secretário-Geral do Secretariado Permanente do Fórum é desempenhado por um funcionário a nível de Director Geral.

O Secretariado Permanente tem por funções:

  1. Organizar os trabalhos preparatórios das sessões do Fórum;
  2. Acompanhar a execução das decisões saídas do Fórum;
  3. Informar os Países Participantes sobre o grau de implementação das decisões de acordo com as informações recebidas dos Pontos Focais;
  4. Estabelecer a ligação entre os Países Participantes do Fórum e ocupar-se dos assuntos correntes da organização;
  5. Garantir o apoio financeiro e logístico necessário à execução das acções acordadas pelos Pontos Focais.

Quanto aos Secretários-Gerais-Adjuntos representantes dos Países de Língua Portuguesa, só em Março de 2005 foi possível chegar a um consenso quanto à designação dos dois representantes dos Países de Língua Portuguesa, cabendo essa tarefa, em primeiro lugar, a Angola e ao Brasil, curiosamente os países com os quais a China tem relações económicas preferenciais.

Os Secretários-Gerais-Adjuntos são nomeados, respectivamente, pela RPC, pela RAEM e dois pelos Países de Língua Portuguesa, sendo estes dois últimos designados de forma rotativa e por ordem alfabética. O mandato do Secretário-Geral e dos Secretários-Gerais-Adjuntos é exercido por um período de 3 anos.

Na dependência do Secretariado Permanente foram criadas duas sub-unidades: o Gabinete de Ligação em Pequim, o qual se responsabiliza pelos trabalhos correntes do Secretariado e pela Ligação entre os Países Participantes e o Gabinete de Apoio aoSecretariado Permanente na RAEM, que se responsabiliza pela execução dos trabalhos do Secretariado e das actividades relativas às acções de acompanhamento.

 

Organograma da Conferência Ministerial

[Fonte: Adaptado de Boletim Trimestral, http://www.forumchinaplp.org.mo/pdf/forumboletim_no1.pdf]

 

Organograma do Secretariado Permanente

[Fonte: Adaptado de Boletim Trimestral, http://www.forumchinaplp.org.mo/pdf/forumboletim_no1.pdf]

 

No quadro do Plano de Actividades de Acompanhamento têm consistido essencialmente na organização de colóquios/cursos de formação e sessões de divulgação do ambiente de investimento nos países participantes e na promoção de visitas de alto nível.

No Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa integram-se também “Bolsas de Contactos Empresariais” que abrangem áreas de comércio, projectos de cooperação e de investimento, tecnologias, etc. Durante estas sessões são prestadas informações sobre os procedimentos a seguirpelos investidores, sobre os projectos relevantes, as políticas preferenciais destes países, entre outros.

Após completa a descrição da estrutura e funcionamento do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa a apreciação que se pode fazer é a de que este foi um projecto bem concretizado pela RPC que soube maximizar as potencialidades da recém criada Região Administrativa Especial de Macau e aproveitar a especificidade do “segundo sistema”, de forma a tirar dividendos deste micro-território, como que recompensando dos quase 500 anos em que dele não pode usufruir. É opinião do professor Doutor Narana Coissoró que “em três anos, o Fórum já fez mais pelos países lusófonos do que a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa em dez”. Já o Secretário-Executivo-Adjunto da CPLP, Tadeu Soares, afirma que o Fórum “é como um shopping center onde a China pode ir de loja em loja falando com os ministros dos países lusófonos”1.

Torna-se difícil a avaliação dos valores económicos do Fórum, pois a China continua a promover de forma activa o plano bilateral. Iniciativas como o Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa constituem, acima de tudo “operações de charme” do governo chinês, no sentido de dar visibilidade, em tom politicamente correcto, à estratégia de aproximação da China a África e aos PLP. A interdependência é cada maior e vai continuar a ser, bem como, a influência criada pela RPC nesses países.

Conclusão

A emergência da China como grande potência económica representa o maior factor de mudança na economia mundial e o seu impacto em vários domínios como o político, económico e social traz, no sentido lato, amplas consequências para o mundo e, no sentido restrito desta pesquisa, para os países de língua oficial portuguesa. Neste sentido, Macau desempenha de forma estratégica o papel de plataforma de ligação ainda que os países de língua oficial portuguesa se encontrem geograficamente distantes. No entanto, a língua e a cultura portuguesa são elos que a China usa para se aproximar e fazer valer os seus interesses quer no campo político, quer no campo económico.Metaforicamente falando, quase se podia assemelhar a actual influência da China nestes países, sobretudo nos africanos, ao lusotropicalismo definido por Gilberto Freyre, mas desta feita sob a forma de “sinotropicalismo”, centrado na nova presença chinesa nos trópicos.

Do ponto de vista ideológico, o Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa é uma prioridade política do governo da República Popular da China na aproximação aos países lusófonos e reflecte, no sentido pragmático e que sintetiza todo o trabalho, que esta é, sem dúvida, uma luta pelos mercados, uma luta de interesses e uma luta por recursos.

 

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