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Hans-Tartupaluk: os viquingues contra-atacam?

Apartados xeográficos Europa ARQUIVO
Idiomas Galego
 Ilha Tartupaluk, vista satélite, clic para aumentar
Ilha Tartupaluk (Hans island), clic para aumentar
A ilha ártica de Hans, Tartupaluk em groenlandês, foi o motivo da particular disputa que desde faz duas semanas vêm mantendo canadenses e dinamarqueses. A pequena ilha desabitada, um com de apenas 1,3 quilômetros quadrados de superfície situado no médio do Estreito de Nares (que separa a ilha canadense de Ellesmere do norte da Groenlândia), é a ponta do iceberg das disputas territoriais árticas nas que se vê envolto o Canadá.
 

A ilha ártica de Hans, Tartupaluk em groenlandês, foi o motivo da particular disputa que desde faz duas semanas vêm mantendo canadenses e dinamarqueses. A pequena ilha desabitada, um com de apenas 1,3 quilômetros quadrados de superfície situado no médio do Estreito de Nares (que separa a ilha canadense de Ellesmere do norte da Groenlândia), é a ponta do iceberg das disputas territoriais árticas nas que se vê envolto o Canadá.

Descoberta na segunda metade do século XIX e nomeada aparentemente trás o explorador groenlandês Hans Heindrich, sua soberania não foi aclarada no momento da delimitação de fronteiras entre os dois países em 1973 e desde então se vêm sucedendo as manobras de ambas as partes. Desde 1984, ano no que o ministro dinamarquês da Groenlândia visitou a ilha, as forças armadas da Dinamarca levam a cabo inspeções regulares (a última foi em 2003) durante as quais se repunha a bandeira nacional.

O 13 de julho do mês passado soldados canadenses deslocaram-se até a ilha para colocar uma placa e sua própria bandeira. Uma semana mais tarde o ministro da defesa daquele país, Bill Graham, visitou a ilha, desenlaçando a crise. O dia 25 o governo da Dinamarca anunciou o envio de uma carta de protesta e um dia depois o delegado do governo para Groenlândia denunciou a ocupação canadense da ilha.

No fundo vislumbram-se os interesses de ambos os países pelo seu controle. De abrir-se o passo do Nordeste ao tráfico marítimo internacional recortaria o recorrido entre Europa e Ásia em 5.000 milhas náuticas. Isto iria beneficiar especialmente aos grandes petroleiros que pelas suas dimensões não podem atravessar o Canal do Panamá devendo circunavegar toda a América do Sul.

 Bandeira de Dinamarca na Ilha Tartupaluk, clic para aumentar
Desde 1984, ano no que o ministro dinamarquês da Groenlândia visitou a ilha, as forças armadas da Dinamarca levam a cabo inspeções regulares (a última foi em 2003) durante as quais se repunha a bandeira nacional.
Bandeira de Canadá na Ilha Tartupaluk, clic para aumentar
O 13 de julho do mês passado soldados canadenses deslocaram-se até a ilha para colocar uma placa e sua própria bandeira. Uma semana mais tarde o ministro da defesa daquele país, Bill Graham, visitou a ilha, desenlaçando a crise. O dia 25 o governo da Dinamarca anunciou o envio de uma carta de protesta e um dia depois o delegado do governo para Groenlândia denunciou a ocupação canadense da ilha.
 

Canadá, Dinamarca, Rússia e Noruega consideram partes do Ártico como ‘águas nacionais’ enquanto os Estados Unidos e a maior parte dos países da União Européia consideram o Estreito de Nares águas internacionais. Ainda que na atualidade apenas seja navegável durante os meses do verão, com o derretimento dos cascos polares devido ao aquecimento global, cabe a possibilidade de que num futuro próximo se converta num roteiro viável durante uma parte prolongada do ano.

A questão dos recursos naturais tampouco é alheia ao conflito. Dome Petroleum realizou numerosas prospecções na ilha a inícios dos oitenta e têm-se instalado já tanto plataformas como ilhas artificiais no estreito. Não se pode esquecer que na Groenlândia existem várias minas de ouro e diamantes e que, desde 2004, se têm lançado licencias para a exploração dos recursos fósseis (petróleo e gás) baixo o Estreito de Davis, na sua vertente dinamarquesa, é claro. Curiosamente, a maior destas licenças foi concedida à corporação EnCana, uma transacional sediada em Alberta, no Canadá. A região possui também importantes bancos pesqueiros (especialmente de gambas e fletám) cujo controle fica também em função do reparto das águas territoriais.

Por outra banda, as forças armadas do Canadá, e sua Armada em particular, têm utilizado a disputa sobre a ilha como escusa para maiores inversões em fragatas preparadas para condições árticas, como das que dispõe a Dinamarca. O Ministério da Defesa daquele país, que lançou um ambicioso programa de cinco anos para reforçar sua presença nos territórios do Norte (a incluir um sofisticado sistema de radares e satélites(1) tenta de alguma forma confrontar a longa tradição militar ártica dinamarquesa, cujo exército se acha ademais num processo de renovação do qual sairão fortalecidas suas capacidades de projeção estratégica polar(2). De alguma forma, para o Canadá, a Ilha de Hans representa o desafio, político e militar, de defender os territórios que reclama para si. Como no antigo modelo colonial africano, se não existe a capacidade de defesa de um território, não se pode falar de controle efetivo.

Humor no Google

Será, no entanto, uma das primeiras crises diplomáticas espoletadas desde o Google, uma vez que um indivíduo dinamarquês comprou um ‘banner’ ligado ao comunicado inserido na web do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Dinamarca. Outro indivíduo, nesta ocasião canadense, irritado pelo ponto de vista dinamarquês, inseriu seu próprio anúncio afirmando a soberania do Canadá sobre a ilha.

Por ventura, as partes implicadas souberam levar a crise com humor. Apesar da idéia inicial de uma boicotagem sobre as pastas danesas, o Ministério dos Negócios Estrangeiros do Canadá aclarou que, como gesto de boa vontade, permitiria a venda das bolachas daquela procedência na sua cantina. Uma companhia de investimentos mesmo tentou apelar ao sentimento patriótico dos seus potenciais clientes, para que uma vez fizeram sua pequena fortuna através da empresa se aposentaram na Ilha.

Enquanto a batalha se livre apenas depositando regularmente garrafas do licor nacional (uísque e aquavit respectivamente) baixo a bandeira içada no gélido com não haverá problema algum além da eventual ressaca. Uma possível saída poderia ser colocar a fronteira justo no meio da ilha, convertendo-a no único território no qual se poderia ter um pé na Dinamarca e outro no Canadá. Sem dúvida um grande logro que os turistas saberiam apreciar.


Notas:

(1) O sistema atual, o RADARSAT-1, tem capacidades de vigilância limitadas, o que junto das reduzidas possibilidades de resposta dificultam o controlo destes territórios. O RADARSAT-2 dois, no que estão trabalhar, deveria corrigir estas deficiências. Outro problema reside no facto de que a Armada canadense apenas pode operar no Ártico durante algumas semanas de Agosto e Setembro, pois não possui navios capacitados para atravessar o gelo. Em parte, pretende-se diminuir esta trava mediante a aquisição de aviões não tripulados e novas e melhoradas aeronaves Twin Otter.

(2) A idéia é aumentar a capacidade das forças a projetar na Groenlândia, o que se complementará com a reposição de duas das patrulheiras corta-gelo classe Agdlek. Na atualidade a Dinamarca dispõe de quatro fragatas classe Thetis de duplo casco para uso em condições árticas e com autonomia de 16.000 km e que habitualmente navegam equipadas com um helicóptero Lynx. A diferença do Canadá, que baseia a defesa dos seus territórios árticos nas ‘milícias’ de nativos (os ‘Rangers’) e algumas forças regulares, a Dinamarca dispõe de forças especiais, os Slæede patuljen da Frømandskorpset, destinas ao controlo da Groenlândia. Os F-16 da Flyvevåbnet podem voar, e já o têm feito, desde Ålborg, sua base na Dinamarca, até Søndre Strømfjord, na Groenlândia e helicópteros, como os AS 550 Fennec, também podem ser mobilizados para os territórios do norte.