ESTE ARTIGO FAI PARTE DO IGADI ANNUAL REPORT 2022-2023 “GLOBALIZACIÓN E MULTIPOLARIDADE EN TEMPOS DE GUERRA”
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Um ano decisivo para as nações lusófonas

O ano de 2022 ficou marcado pelos processos eleitorais nos países da lusofonia, ora representando uma mudança no alinhamento político e ideológico, ora mantendo ideais muitas vezes questionados e até mesmo confrontados por grande parte da população...
Palabras chave lusofonia
Idiomas Portugués

A polarização política característica do cenário internacional nessa segunda década, esteve presente em praticamente todos os processos de votação, al final a democracia ainda é um sistema novo e em processo de consolidação na maioria de países que falam o português.

Certo é que a democracia como conceito seja bastante antigo, quando analisada historicamente, desde Péricles aos dias atuais, porém muita coisa mudou. Havendo uma série de questões e controvérsias que foram evoluindo conforme o pacto social estabelecido e as transformações da sociedade e das relações de poder e nos últimos anos a crescente pressão internacional e os impactos da tecnologia e das redes sociais.

Nunca antes a frase de Winston Churchill (ou ao menos a ele se lhe atribui tal citação) que: “A democracia é o pior dos regimes políticos, mas não há nenhum sistema melhor do que ela”

Esteve tão plasmada na realidade dos países, onde o conservadorismo com nuances de autoritarismo tentava pleitear com a própria representação social, colocando muitas vezes em dúvidas a própria capacidade do sistema democrático de permitir uma maior participação e representação, apesar das suas diferentes formatações tais como o presidencialismo ou o parlamentarismo, sistema bicameral e unicameral, multipartidarismo e bipartidarismo etc.

Porém a polarização não está presente somente nos países periféricos, nem mesmo as democracias mais desenvolvidas conseguiram resolver alguns paradoxos derivados da própria realidade social e da representação cidadã.

Temas cada vez mais complexos tais como a não participação de estrangeiros (na maioria de países) do sistema eleitoral, mesmo quando legalizados, continuam sendo marginalizados desses processos, ainda quando muitas vezes formam parte das discussões políticas, tais e como aconteceu em Portugal e no Brasil, ainda que somente podem participar após serem naturalizados, o que constituí um paradoxo social e um empecilho para sua real integração, já que por um lado temos um cidadão que participa da economia de um lugar, paga impostos e demanda serviços públicos, mas por outro lado temos sua total incapacidade de influenciar sua realidade ou de lhe garantir a representação de seus interesses, gerando um paradoxo político que somados as pressões da comunidade internacional e ao incremento dos fluxos migratórios, geram cidadãos que são usados como moeda de troco porém sem participação alguma nos sistemas representativos nem na tomada de decisão.

O próprio sistema democrático foi colado a prova mais de uma vez, pois a definição do que seria uma verdadeira democracia frente a outras emuladas continua sendo bastante ténue havendo um critério duplo que muitas vezes é definido por tudo, exceto pela vontade popular ou pela consolidação de um pacto social.

O próprio tratamento que recebem os líderes europeus por exemplo, que podem se manter durante anos na frente de seu país sem menor problemas ou questionamentos por parte da comunidade internacional, não é aplicado quando se tratam de líderes latinos ou africanos, que são questionados constantemente quando buscam uma reeleição.

Também não existe uma definição clara de como deve funcionar o processo e como este deve se adaptar a realidade de cada nação, sua cultura ou religião (quando esta forma parte do Estado), uma vez que a universalidade da representação democrática é mais um ideal do que uma realidade.

Na lusofonia as eleições livres e a própria democracia são um processo bastante recente e constantemente colocados a prova, certo é que houve tentativas anteriores tais como a I República de Portugal ou a República Velha no Brasil, sem embargo somente após o fim da ditadura e dos conflitos civis foi quando de fato o regime democrático se instaurou na luso-esfera e pouco a pouco vem se consolidando.

O ano de 2022

O ano de 2022 representa um marco importante dentro do processo de consolidação e transição democrática nos países de língua portuguesa, já seja pela polarização crescente que se refletiram nas diferentes campanhas eleitorais, já seja o fato de que são as primeiras eleições pós pandemia em um contexto de quebra de paradigma internacional, com o crescente atrito entre as principais potências, o auge da globalização e seus questionamentos, a geração de uma sociedade global com elevado acesso a informações, porém altamente polarizada e carente do diálogo e da semântica política, cuja tela de fundo é o conflito da Ucrânia e os alinhamentos derivados do mesmo.

Portugal: O ano começou com as eleições parlamentárias de Portugal onde a esquerda conseguiu se manter no poder ainda com a crescente pressão de setores conservadores e de extrema direita que sem dúvidas refletem um incremento das tensões sociais, que podem eclodir no país lusitano. O incremento dos fluxos migratórios dos últimos 5 anos, fizeram parte do discurso político em Portugal, assim como a insatisfação gerada pelo incremento dos preços, inflação está agravada pela Guerra da Ucrânia.

Timor Leste: Em março, Timor Leste, uma das democracias mais jovens do planeta, teve seu primeiro turno para uma disputada eleição presidencial a qual somente seria definida no segundo turno realizado em abril onde o prêmio Nobel da Paz, José Ramos Horta se consolidou como líder. O país tem aumentado suas relações com a lusofonia e faz o uso do português como língua franca a modo de construir e reforçar sua identidade nacional.

Angola: Em agosto, foi a vez da Angola, onde a polarização social ficou claramente visível além da desigualdade entre as diferentes camadas sociais e das diferentes dimensões que compõe a realidade do país africano, cuja liderança permanece imutável desde sua independência de Portugal. A disputa foi marcada pela presença de observadores internacionais e o resultado foi amplamente questionado, gerando tensões locais que devem permanecer neste ano de 2023.

Santo Tomé e Príncipe: que foi as urnas em setembro para formar um novo parlamento, registrou a vitória do partido de oposição Ação Democrática Independente, o que deve produzir mudanças políticas e estruturais no país que busca uma reforma institucional capaz de inserir o mesmo no cenário internacional e na realidade global.

Brasil: Com uma das eleições mais disputadas de sua história e que roubou o protagonismo dos demais países lusófonos assim como outras nações do hemisfério sul. O enfrentamento do ex-presidente Lula e do ex-presidente Jair Bolsonaro, foi decidido no segundo turno, com uma diferença de pouco mais de 2 milhões de votos, Lula ganhou a presidência, ainda que seu adversário formou maioria na câmara e no senado.

Lula se transformou no único presidente da história do Brasil a vencer por terceira vez uma eleição democrática.

Em seu discurso de posse, Lula revogou o acesso as armas de fogo, aprovado por Bolsonaro, criou ministérios e fez uma avaliação de toda a gestão de seu antecessor, deixando clara a situação na qual recebe o país.

Lula é considerado pelas instituições financeiros o presidente com melhores resultados econômicos da história do Brasil, seguindo o modelo desenvolvimentista a diferença de seu rival que defendia o alinhamento econômico com os Estados Unidos.

Guiné Equatorial e Guiné Bissau concluem a lista, ambas com eleições para o parlamento, sem embargo a situação de Guiné Bissau sem dúvidas é a que mais teve repercussão internacional, pela crescente crise interna e a instabilidade política e democrática do país. No caso de Guiné Equatorial o país já integrou missões de observação eleitoral em Timor Leste e sua aproximação a CPLP (Comissão de Países de Língua Portuguesa) deve promover o mesmo em relação ao Brasil, já internamente o país continua sendo uma grande incógnita, sendo talvez a falta de transparência um sintoma de uma necessidade de mudança.

2023 se projeta como um ano de mudanças estratégicas e uma reaproximação dos países de língua portuguesa que formam a CPLP assim como o BRICS conforme já indicado pela presidência do Brasil.

O Sul global parece aos poucos retomar sua normalidade, focados a uma maior integração e colaboração, o que sem dúvidas pode inclinar a balança de poder e até mesmo repercutir nos resultados econômicos mundiais.

Este artigo fai parte do IGADI Annual Report 2022-2023 “Globalización e multipolaridade en tempos de Guerra”, que podes descarregar aquí.


Bibliografia

  • TSE Brasil – https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2022/Abril/comunidade-dos-paises-de-lingua-portuguesa-atuara-como-observadora-nas-eleicoes-2022
  • Comissão Nacional de Eleições de Portugal https://www.cne.pt/
  • Embaixada da Guiné Equatorial em Portugal https://www.embarege.com/871805_guine-equatorial-integra-missao-de-observacao-as-eleicoes-presidenciais-de-timor-leste
  • «Timor Leste elege Nobel da Paz como novo presidente». Folha de São Paulo. 20 de abril de 2020. Consultado em 20 de abril de 2020
  • CNE Angola https://resultados2022eleicoesgerais.cne.ao/resultados