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O Estado Saaraui e a inconstitucionalidade da carta do Presidente Pedro Sánchez ao Rei de Marrocos

Falar sobre o conflito do Saara Ocidental leva-nos inexoravelmente a falar do seu direito de autodeterminaçom, recolhido em numerosas ocasions pola ONU e pola Corte Internacional de Justiça, no seu Ditame do 14 de abril do 1975, no qual reconhecia “o direito das povoaçons do Saara Ocidental à autodeterminaçon”. Contodo, o Acordo tripartito de Madri de outubro de 1975 (Espanha, Marrocos e Mauritânia, (acordo nulo a teor do Direito Internacional) o governo franquista de Espanha, em contradiçom com as suas posiçons anteriores pró-saarauis,  aceita dar por terminada a presença no Saara Ocidental antes do dia 28 de fevereiro do 1976, cedendo a Administraçom do Território a Marrocos e Mauritânia que repartirám o território entre elas. O dia 27 de fevereiro de 1976 foi autoproclamada polo Frente Polisário a República Árabe Saaraui Democrática, que ingressou em 1984,  na Organizaçom para a Unidade Africana. Marrocos abandonou esta, exigindo, para voltar, a expulsom da RASD. Contodo, no ano 2017, Marrocos ingressou  na Uniom Africana, sucessora, no 2001, da anterior OUA, sem apresentar nengumha reserva em relaçom com a condiçom da RASD como Estado como membro de pleno direito.

Mauritânia retirou-se da parte  que ocupara do território saarahui em 1979, em virtude do Tratado de Argel de 1979, entre ela e o Frente Polisário. Depois deste Acordo, Marrocos ocupou também a maior parte do território abandonado por Mauritânia. A sua conduta ocupacionista, incorrendo em crime internacional, constitui um atentado grave, entre outros, contra o princípio de livre determinaçom, o  que proíbe a ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a independência de qualquer Estado e contra a Convençom para a Prevençom e a Sançom do Delito de Genocídio (1948). Em 1991,  Conselho de Seguridade das Naçons Unidas estabeleceu a Missom das Naçom Unidas para o Referendum no Saara Ocidental, o qual nom foi realizado ainda.

Neste contexto bem difícil desenvolve-se toda a problemática dos interesses saarauis em relaçom aos Acordos comerciais sobre produtos agrícolas e pesqueiros entre a Uniom Europeia e Marrocos, tratada em diversas sentenças dos Tribunais europeus. É necessário resenhar o incumprimento por Marrocos da obriga internacional de controlar as suas fronteiras: invasom de Ceuta por milhares de moços e saída polo mar de centos de pessoas cara as Canárias. Conviria revisar a legislaçom espanhola, e mesmo a internacional, procurando agilizaçom das devoluçons.

A carta “autonomista” de Pedro Sánchez  

No passado dia 18 de março a Casa Real marroquina, fixo pública umha carta em que desvelava que Sánchez apoiava o seu plano de autonomia para o Saara, afirmando que: “Espanha considera que a proposta marroquina de autonomia apresentada em 2007 como a base mais seria, credível e realista para a resoluçom de este diferendo”, copiando os qualificativos usados pola subsecretaria de Estado dos Estados Unidos da América, W. Shermam no 8 de março em Rabat. Os meios enfatizárom que a carta foi escrita originariamente em francês e depois traduzida, galicismos incluídos, para o castelhano. Nos âmbitos diplomáticos causou estranheza a comunicaçom por carta, e mesmo estupefaçom que Sánchez referi-se o «ministro de Assuntos Europeus, Uniom Europeia e Cooperaçom», quando a denominaçom é a de  Ministro de Assuntos Exteriores, Uniom Europeia e Cooperaçom.

Estes feitos, postos em conexom com as operaçons de Pegasus, fam que nom se desbote a possibilidade de que no entramado da espionagem Pegasus, esteja Marrocos. Isto leva a alguns a pensar que a carta, dada a conhecer, contra os usos diplomáticos, polo Estado recetor, esteja condicionada polo conhecimento por Marrocos de algumhas questons que pudessem comprometer  Pedro Sánchez.

Inconstitucionalidade da carta do Presidente

Entrando um pouco mais polo miúdo na carta, direi que Sánchez atua sem competências. Ao respeito, vejamos como a Constituçom espanhola, no seu art. 97, prescreve que: “O Governo dirige a política interior e exterior…”. Assim, no art. 98, no seu aptdo. 2, que “O Presidente dirige a açom do Governo e coordena as funçons dos demais membros do mesmo, sem prejuízo da competência e responsabilidade direta destes na sua gestom”… Acó temos umha questom de fundo que nom é banal. O Governo de Espanha, como direçom da política exterior de Espanha, em relaçom com a carta, nom  levou a cabo nengumha açom cuja direçom pudesse caber ao Presidente. Consequentemente, o Presidente do Governo nom dirigiu açom nengumha do Governo, senom que realiza umha atuaçom pessoal, fora do marco constitucional, ou, com outras palavras, inconstitucional (neste sentido também C. Ruiz Miguel). 

Ainda, tendo em conta a posiçom, no 30 de março passado, da maioria  do Congresso dos Deputados, incluído o sócio governamental Unidas Podemos –com exceçom do Grupo Socialista- em favor de umha iniciativa em apoio da posiçom tradicional do Estado, no marco das atuaçom da Naçons Unidas, a prol da autodeterminaçom saaraui  ‑e contra o plano autonomista de Marrocos, que, polo demais, careceria de qualquer tipo de segurança de permanência no futuro-. Em consequência,  o valor  da carta, feita sem nengum tipo de consulta institucional, carece de sustém jurídico. Mesmo, a Zarzuela, pujo-se de perfil com um “A política exterior corresponde-lhe ao Governo”. Assim, dirigentes políticos, entre outros, como J. Asens, presidente do grupo de Unidas Podemos no Congresso, e E. Bals, portavoz de Ciudadanos, sugerírom umha possível chantagem de Marrocos ao Presidente Sánchez. 

A carta de Pedro Sánchez poderia ser entendida, finalmente, como umha mera declaraçom pessoal de intençons na procura, desatendendo as poucas confianças que inspira historicamente Marrocos, de um apoio à posiçom do Estado espanhol a respeito de umha série de assuntos em que venhem mantendo diferenças, tais como a integridade territorial em relaçom com Ceuta e Melilha, e outros com afetaçom às Canárias, como a delimitaçom das águas territoriais, plataforma continental e zona económica exclusiva, gestom do espaço aéreo saaraui, etc. Frente a essas esperanças vazias, a carta fai surgir umha realidade bem crua como é o estrago de umha boa relaçom política com Argélia, país com abundantes recursos energéticos.